quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

È NATALE! È NATALE! NON SOFFRIRE PIÙ.

É NATAL!  É NATAL!  NÃO SOFRA MAIS.


"Dizem que, ao chegar a época em que se comemora a Natividade do nosso Salvador, o pássaro matinal se põe a cantar a noite inteira, nenhum espírito então se atreve a adejar pelo espaço, as noites são saudáveis, os planetas se acalmam, as fadas não atuam, nem as feiticeiras usam o seu poder de encantamento.   Como esse tempo é feliz e cheio de graça".(W. Shakespeare)   -   na última capa do programa da peça "O BOI E O BURRO NO CAMINHO DE BELÉM", de Maria Clara Machado, na montagem do TABLADO com direção da autora.




               O Natal se avizinha.   Aproximam-se mais as pessoas.   Mais desarmadas, mais feito crianças.   É tempo de celebrar o nascimento daquele que vem trazer a este conturbado mundo a mensagem de amor, justiça e paz entre os homens.   Tempo de regozijo.   Tempo de agradecer por tudo e a todos quantos nos fizeram companhia durante o decorrer de mais um ano nesta caminhada rumo ao Alto, onde brilha uma estrela fulgurante e anunciadora de vida nova, vida plena.   Vida.

               Gostaria de compartilhar com vocês, amabilíssimos leitores, justamente agora às vésperas do Natal de 2011, a lembrança de momentos de enlevo, de ternura, que experimentamos ao representar ao ar livre, em praça pública, "O BOI E O BURRO NO CAMINHO DE BELÉM" - primeira peça de grande sucesso de Maria Clara Machado, peça de 1953, concebida inicialmente para teatro de bonecos.       
                                                                                                                                                                               Apresentada em Santos e São Vicente, início dos anos 80 se a memória não falha, nela tomei parte fazendo um dos três Reis Magos - o Rei Amarelo, o que parecia óbvio - de improviso, a convite de Antonio Laerte Marioto (o Alamar, já mencionado anteriormente neste blog) e junto com Altamir Leski e outros.   Leski partiria logo depois com seus quase dois metros de altura e seus óculos de fundo de garrafa para Porto Velho (RO) em busca de algum Eldorado.   Não me recordo, mas parece-me que o espetáculo tinha direção e produção de Antonio Roberto Marchese, nome bastante influente no teatro amador santista - ele, já se profissionalisando à época.

               O texto, que  há mais de cinco décadas vem sendo montado e remontado, sempre com expressiva aceitação e deleite do público, independente da idade, pode ser encontrado em Teatro I, "Coleção Teatro" (Editora AGIR).
  
               Já nos últimos anos do grupo escolar (Grupo Escolar Dr. Silveira Brum, em Muriaé-MG) havia eu interpretado o lenhador de "Chapeuzinho Vermelho", também de Maria Clara Machado.   Mais tarde tivera contato com o Monólogo do Vaqueiro (Auto da Visitação), de Gil Vicente.   Assim, a pequena e simplória participação em "O BOI E O BURRO NO CAMINHO DE BELÉM" foi para mim muito prazerosa.

               Recomendamos acessar http://www.youtube.c601kdjajum/ by izamendonca partes 1,2 e 3 para uma visualização da peça em montagem de grupo paranaense.

               Um Feliz Natal e um Próspero Ano Novo são os votos mais sinceros deste blogueiro aos amigos e leitores deste singelo amontoado de reminiscências.   Coração e mente guardarão para sempre o carinho e a lembrança de vocês.   Que o Menino Jesus possa nascer em cada coração e que as bênçãos celestiais sejam os verdadeiros presentes que recebemos nesta noite santa, noite de paz.   Gloria in excelsis Deo!   Glória a Deus nas alturas! - façamos coro com os anjos, e celebremos!

OBS.: Veja e ouça, também, www.youtube.com/watch?v=HhrtTtPORjw 

terça-feira, 29 de novembro de 2011

A AVENTURA DE MONTAR "TRANSE"

A AVENTURA DE MONTAR "TRANSE" (de Ronaldo Radde), direção de Jorge Elias.
                    (Caricatura do blogueiro feita por artista de rua nos anos 70)


Vamos mais uma vez voltar no tempo, agora para rememorar as muitas alegrias e - por que não? - alguns dissabores vivenciados por ocasião dos ensaios, preparativos para a montagem, e apresentação do espetáculo teatral "TRANSE" pelo GRUTA - Grupo Unido de Teatro Amador, de Santos - SP do qual fizemos parte.

Início: A formação do grupo

Atendendo a anúncio veiculado nos jornais locais (dois, à época - A Tribuna e Cidade de Santos) um número bastante expressivo de jovens se apresenta para formar um grupo de teatro amador - mais um dentre tantos - com a proposta de estudar informalmente a história do Teatro; os seus teóricos, autores, diretores; o movimento amador na região, no estado, e mesmo nacionalmente; as técnicas teatrais; tudo com vistas a montagem de um espetáculo ao término de alguns meses de ensaios de um texto a ser escolhido, mediante deliberação, no decurso dos encontros realizados duas (ou até três) vezes por semana em espaços gentimente cedidos como foi, no caso, o Círculo Operário do Embaré.   A formação do grupo se deu, efetivamente, mediante ata de fundação, com designação da diretoria, escolha do nome GRUTA-Grupo Unido de Teatro Amador, etc. atendendo a formalidades. (Jorge Elias, sua esposa Célia, Nodge Filgueiras, Carlos Ferreira, sua esposa Luzinete, Achilles Abreu, Bruno Antonuche, Sidônia, Graça, Maria Lilian Castro, José Carlos Laranjeira, Concheta, Laerte Marioto, estão entre os fundadores).   Era a primeira vez então que muitos ouviam falar de Constantin Stanislawski, Bertold Brecht, Nelson Rodrigues, Dias Gomes, Fernand Arrabal...   Tomou-se conhecimento de textos como "Os fuzís da Senhora Carrar", de Brecht, do qual se fez leitura 'branca', discussão e exercícios de interpretação.   Outros textos foram igualmente abordados.   Quando da escolha da peça a ser montada efetivamente ("TRANSE", de Ronald Radde) foram providenciadas cópias xerox do texto para cada integrante do elenco então escalado, para direção e assistência de direção (que coube a mim), para técnicos - com as anotações específicas: luz, som, etc.   Providenciou-se também o pagamento dos direitos autorais junto à SBAT - Sociedade Brasileira de Autores Teatrais (hoje denominada Sociedade Brasileira de Autores, mas mantendo a sigla SBAT).   Foi providenciada a censura prévia (texto e ensio geral) e também a contratação de data no Teatro Municipal de Santos, com o apoio da Secretaria Municipal de Cultura e Turismo - SECTUR (mais tarde SECULT - Secretaria Municipal de Cultura) tendo como secretário o senhor Carlos Pinto.   Carlos Pinto e Thaná Correa, fiéis escudeiros um do outro, são dois nomes intimamente ligados ao movimento de teatro na cidade, com passagens diversas (e alternadas) pela burocracia municipal em diferentes gestões - o que certamente denota a competência de ambos - a despeito de alguma restrição feita, principalmente nos idos de 70 e 80, por parte de alguns.   Recentemente o senhor Carlos Pinto recebeu o título honorífico de Cidadão Francano, outorgado pela Câmara Municipal de Franca, sob a presidência do vereador Marco Garcia, mediante indicação coletiva, em solenidade acontecida no Teatro Municipal "José Cyrino Goulart", no dia 26 de novembro de 2011, às 20 h, e que contou com a apresentação da Orquestra Sinfônica de Franca, como parte das comemorações pelos 187 anos de Franca.   

TRANSE - A peça

"TRANSE", de Ronald Radde, autor gaúcho (Porto Alegre), é de 1970.   É um drama, "um espetáculo denso e sufocante".   O Catálogo da Dramaturgia Brasileira apresenta a seguinte sinopse: "Cinco personagens, (3 masc. e 2 fem.) cada um com uma origem diferente, encontram-se em local neutro, que apenas se sabe ser após a morte, e aí debatem suas lembranças e culpas, desnudando todas as suas falsidades que, em seu paroxismo, buscam mostrar como um resumo da própria condição humana."    Ou como nós colocamos: "Transe", de Ronald Radde, narra o drama pessoal de cinco personagens (um funcionário público, uma mulher adúltera, uma mulher feia e rejeitada, um homossexual, um filho de militar com tendência suicida), que vão se desvelando, se revelando, quase que num psicodrama, numa situação limite: a experiência de quase-morte.
Além da peça "Transe", Ronald Radde é autor de outros sucessos como "Apaga a luz e faz de conta que estamos bêbados"; "B... em cadeira de rodas"; "João e Maria nas trevas".   É fundador, mantenedor, diretor do Teatro Novo, em Porto Alegre, há mais de 40 anos.

A concepção do espetáculo "TRANSE", por Jorge Elias, para o GRUTA-Grupo Unido de Teatro Amador  

Jorge Elias, ao dirigir "Transe", decidiu que face a dureza do texto - especialmente quanto à fala da personagem central Jonas, filho de militar, revoltado e suicida - que certamente incomodaria o censor (e parte da plateia, com certeza), decidiu "amaciar", "esfriar", tornar mais "palatável" o texto TRANSE, de Ronald Radde, concebendo um prólogo e um coro (como na tragédia grega clássica) com inserção de cantoria - música composta especialmente para esta montagem pelo jovem maestro Juan Serrano.   A música, o colorido feérico das túnicas do coro, as luzes, davam um ar mais ameno a apresentação.   A princípio, não muito bem aceita esta concepção por parte de alguns do grupo, eu inclusive; entretanto, reconheçamos, isto certamente foi fundamental para que o grupo pudesse se apresentar naquele momento de grandes tensões político-sociais.

A música, de Juan Serrano

Coube a mim a incumbência de preparar os integrantes do coro e do prólogo no tocante a parte musical - especialmente o canto.   Eu era um dos poucos afeitos a música (José Carlos Laranjeira tocava acordes simples ao violão mas não lia partitura).   Embora não fosse propriamente um músico, um instrumentista, eu também tocava acordes simples no violão mas havia tido aulas de Canto Orfeônico no ginásio (hoje, 5ª a 8ª séries do Ensino Fundamental) e aprendera bem a ler partitura.   Recebera do jovem e talentoso maestro Juan Serrano, a quem fora solicitado - em caráter de urgência - compor um tema musical especialmente para "TRANSE" e, ainda mais, música incidental para a mesma peça teatral, o material reproduzido em parte acima.   Quando primeiro chegou-me às mãos, apresentava somente a linha melódica sem a harmonia.   Solicitei ao maestro a gentileza de acrescentar as cifras, no que fui prontamente atendido, facilitando enormemente o trabalho.   Ensaiamos uma dúzia de amadores no coro - na verdade cantando em uníssono pois não tínhamos como fazer arranjo para duas, três ou mais vozes.


Prólogo - A inclusão de pessoa com deficiência visual

Jorge Elias, como diretor do espetáculo, concebera um prólogo que consistia nas falas alternadas de dois atores (um representando o negativismo, o mal, a escuridão - eu; outro representando o otimismo, o bem, a claridade - Benê).   Benê, como era carinhosamente tratada, era interna da associação beneficente LAR DAS MOÇAS CEGAS, com ótima sede situada na Avenida Ana Costa, onde Benê estudava (em Braile) e desenvolvia outras atividades.   Era negra.   E um pouco acima do peso para os padrões à época.    Além das poucas falas do prólogo (Benê dizia sua fala mais plantada, mais estática; eu dizia a minha fala em movimentos ao redor de Benê, com muito gestual) também cantávamos e tocávamos violão acompanhando o coro.



Técnica

O cenário da peça "TRANSE" é despojado, praticamente inexistente.  Um tablado, sobre o qual estão os cinco atores, ostenta a um canto em relêvo um telefone (do modelo antigo) sob foco de luz intensa constante até a última cena, quando é o último foco a ser apagado.
O figurino é também originalmente pobre, constituindo-se de roupas hospitalares.   A senhora Célia, esposa de Jorge Elias, encarregou-se da confecção do figurino.   As cinco personagens que viviam o drama vestiam roupas hospitalares ('camisolas') de que se desvencilhavam a medida que cada qual ia fazendo sua apresentação, mantendo então apenas algum 'aplique' que denotava sua inserção social: o funcionário público, a mulher adúltera, a mulher feia e rejeitada, o homossexual, o filho de militar.   Célia confeccionara também a indumentária vistosa, colorida, longa, dos integrantes do coro e dos dois atores que faziam o prólogo.
A iluminação e sonoplastia (esta consistia basicamente de som de batida de automóvel, sirene de ambulância, toque de telefone) foram executadas por funcionário do Teatro Municipal de Santos, senhor Módica.    

Elenco

Carlos Ferreira..............................Jonas (filho de militar)
Nodge Filgueiras...........................Anselmo (homossexual)
Bruno Antonuche..........................funcionário público
Maria Sidônia...............................mulher feia
Maria das Graças.........................mulher adúltera
Achilles Abreu  e  Benedita...........prólogo
Maria Lilian, Concheta, Luzinete, José Carlos Laranjeira, Edson Bispo e outros: CORO

O resultado final foi bastante satisfatório mesmo para alguém como eu que não gostara de início da concepção do diretor para "TRANSE".   Jorge Elias chegou a mencionar que o próprio senhor Carlos Pinto teria ficado muito bem impressionado com o espetáculo.   Fato é que todos nós estávamos eufóricos com o feito, a aventura de montar "TRANSE", de termos fundado um grupo de teatro amador, de termos conseguido acolher uma pessoa com deficiência visual e necessidades especiais (além de já ter idade bem acima da média dos demais participantes), de termos tido momentos de desinibição, de relaxamento, de concentração, de aprendizagem, de descobertas.

Namoro sob os refletores

Não se pode deixar de mencionar que à época "rolou" namoro entre alguns de nós, integrantes do elenco.   Pelo menos dois ou três casais apaixonados se formaram ali, além dos já casados.   Já formados ou cursando a faculdade ali estavam psicóloga, assistente social, administrador de empresas, jornalista, além de funcionários no comércio, indústria, serviços (e um ou outro desempregado, dentre os mais jovens). 

Burocracia

O teatro amador de Santos sempre foi um movimento forte, tendo projetado nomes importantes que fazem sucesso até hoje na TV, no cinema, no teatro mesmo, ou ainda em outras carreiras como jornalismo, publicidade e propaganda, psicologia, etc.   Parece que sempre houve um certo "racha" entre grupos e participantes em relação à Federação Santista de Teatro Amador e mesmo em relação a Secretaria Municipal de Cultura, alguma "animosidade", ainda que se possa entender como algo artificial, "fabricado".   Dos dois nomes fortes da burocracia citados, Thaná Correa (homenageado este ano no enredo da escola de samba vencedora do Carnaval santista - que trouxe como destaque, seu filho, o consagrado ator Alexandre Borges) e Carlos Pinto, talvez se pudesse aventar que o primeiro estivesse mais para a 'criação', enquanto o segundo estava mais para a 'administração'.   Seu livro de cabeceira talvez fosse Il Principe, de Niccolò Machiavelli (1469 - 1527).   Chi lo sà?

Letras completas das melodias: tema musical de "Transe" e música incidental

Tema musical de "Transe"                                                  Música incidental

Você é livre, você decide se quer                                       Da maneira pela qual reajo
Desce, fica parado, busca o infinito,                                    Aos acontecimentos
Retarda o passo, cai e levanta, resvala,                               É que determino o meu futuro
Escapa, se encarcera, se despedaça.                                  Se dou fé aos maus pensamentos
                                                                                          Há uma força que me destrói.
Refrão: Gente que nasce, gente que corre,
            Gente que chora, que morre. (2x)
                                                                                               Música incidental
Você que pensa criou a máquina
Pra dar conforto, vencer o tempo.                                       Por mais árdua que seja a prova
Você a usa como um engenho do mal                                  Jamais abandone a fé,
Se destruindo, só destruindo                                                A esperança e a determinação.
Tudo e todos, sem distinção.                                               Suplantará qualquer situação aflitiva.
                                                                                           Suplantará qualquer situação aflitiva.
Refrão

Você odeia, você se odeia                                                        Música incidental
Ódio marcado, ódio que mata
Ódio terreno, ódio explosão                                                Lembre-se que o desejo atrai
Ódio mesquinho, ódio com ódio                                          As oportunidades
Sem remorso, sem perdão.                                                  E que o medo somente o leva
                                                                                           Ao fracasso
Refrão                                                                                Deus não pune, Deus não pune
                                                                                          Você é quem castiga a si mesmo.
Você é homem, é quase deus
É corpo e alma num só compasso
Por que se avilta mudando o passo
Desse equilíbrio de paz e amor
Mudando o rumo do seu destino
Mudando o rumo do destino
Ser criatura, ser criador.

Refrão

Você é o relógio que marca as horas
Você é a máquina incansável
Você é ternura entre as pessoas
Se não carregar por caminho pedregoso
A sombra do seu passado.

Refrão

Você é luz que pode iluminar
A existência de um ser
Você é o elo que existe
Se procura querer, se procura querer
Querer mudar.

Refrão final: Gente que nasce, gente que foge,
                   Gente que chora, que morre.
                   Gente que é ser, gente que é vida,
                   Gente que sofre, que é gente.   
     
     

sábado, 19 de novembro de 2011

O NAVIO NEGREIRO



(Caricatura do blogueiro - de barba, bigode e cabelo comprido, à época - feita em 1 minuto por artista de rua, com tesoura)
  O NAVIO NEGREIRO

Carlos Ferreira já havia interpretado Jonas, papel central da peça "TRANSE", de Ronaldo Radde, encenada pelo GRUTA - Grupo Unido de Teatro Amador, de Santos-SP, com direção de Jorge Elias; e tinha também atuado conosco em 'Pai ou Responsável', quadro da peça "A INFIDELIDADE AO ALCANCE DE TODOS", de Lauro Cesar Muniz, com direção do mesmo Jorge Elias - que à época era funcionário da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo onde desempenhava as funções técnicas de Desenhista.
Carlos Ferreira, casado, pai de duas meninas já à época, era vendedor na Livraria Martins Fontes, situada na Avenida Ana Costa, no bairro do Gonzaga, em Santos-SP.   Lá esteve por muitos e muitos anos, sempre com um sorriso peculiaríssimo e atenção respeitosa a todos quantos adentravam a maior, a mais sortida, a mais tradicional livraria da cidade.
Por várias vezes manifestara a vontade de encenar um monólogo, especialmente o "NAVIO NEGREIRO", de Castro Alves - o poeta dos escravos.
Estas lembranças me vêm à mente no momento mesmo em que se tem no 19/11 a comemoração do Dia da Bandeira e no 20/11 a comemoração do Dia da Consciência Negra.     
Carlos Ferreira não era negro, nem mesmo mulato.   Solicitou-me que o dirigisse em cena.   Conversamos bastante e iniciamos os ensaios com base no texto, pesquisa de material de cena, música, figurantes, etc.   Decidiu-se que Carlos Ferreira representaria o próprio Castro Alves - dizendo seu poema vigoroso no tombadilho de um navio, mais junto à proa, porém em meio a escravos acorrentados, açoitados, etc.   Muito som de atabaques, hino da Umbanda, efeitos sonoros (e visuais) de água, raios, trovões, etc compunham a proposta, a aposta naquela concepção cênica de "NAVIO NEGREIRO". E, claro, principalmente a construção da cena final quando a plateia se daria conta e veria formada sobre o palco uma 'meia' bandeira: parte de um retângulo coberto de folhas de bananeira (verde); velas acesas (amarelo) em V (proa do navio); ao centro, figurantes recobrem o poeta com um pálio azul; e, de cima, cai sobre todos uma longa fita branca.
Eu já havia visto pelo menos uma apresentação de "NAVIO NEGREIRO" (Vado já se firmara magnificamente como intérprete do poema, e durante muito tempo continuaria a se apresentar, sempre com enorme talento e merecido sucesso).   Eu pretendi conceber o espetáculo de forma diferente, mais dentro do espírito contestador da época - e "cutucar o bicho com vara curta".   Os anos eram difíceis e os gritos, os lamentos dos negros do poema remetiam a outras atrocidades.   Numa época em que vestir vermelho era arriscado; em que o hino nacional só podia ser executado em Fa maior e no andamento indicado (impensável uma interpretação como a de Fafá de Belém por  ocasião da morte de Tancredo Neves); enfim, precisávamos driblar a censura prévia (obrigatória para todo tipo de espetáculo). Poderíamos, mesmo sem querer, estar incorrendo em crime de desrespeito a um símbolo nacional - a Bandeira - assim entendido: alegoricamente a bandeira nacional no chão, cortada ao meio, na cena final elaborada conforme já mencionamos, acompanhada dos versos finais do poema:
                                     " Mas é infâmia demais... "
                                     (...)
                                     " Andrada, arranca este pendão dos ares "
                                     " Colombo, fecha as portas dos teus mares "
                                                                               (Castro Alves, NAVIO NEGREIRO)

Cai a luz em resistência (fade-out).   Desce o pano.

ATENÇÃO: Se você quiser saber muito mais sobre Castro Alves, clique em O COSMONAUTA, (link) na barra ao lado (blog do nosso amigo Saymon Justo). Vale a pena.

Para ouvir "Bandeira de Oxalá" (Hino da Umbanda) acesse http://youtu.be/25P3O948_gM

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

TELL ME THAT ELSE (ELSIE)

TELL ME THAT, ELSE   (ELSIE)

(Achilles F. Abreu)



Baby say that again
Tell me that one more time
Tell me it's not in vain
Oh, say you will be mine
And make me feel happy Else
Oh so happy
Say you'll love nobody else
Oh nobody
Nobody but me!

Come and tell me that Else
Just whisper in my ear
Tell me that you care Else
And let me love you dear
So, then you may ask me Else
Just what you will
'Cause all your dreams, lovely Else
I'll make come real...

I love you my Else!

Aí está mais um exemplo daquilo que nos ocupava à época: criar letras em inglês para eventuais composições musicais, nossas ou de terceiros.   Era bastante comum autores se valerem desse expediente para buscar o sucesso (Moris Albert, com a canção "Feelings"; Paulo Diniz, com "Quero voltar pra Bahia - cujo refrão dizia 'I don't want to stay here / I want to go back to Bahia'; a banda - ou conjunto, como se dizia então - Light Reflections, com "Tell me once again" e tantos outros).   Outra atividade que nos envolvia era a de fazer versões em língua portuguesa para músicas estrangeiras do hit parade.   WHO'LL STOP THE RAIN, de John Fogerty, sucesso do Credence Clearwater Revival, por exemplo, ficaria assim:

Hoje eu lembro o tempo
De criança em São João
Descalço e sem camisa
Sob a chuva de verão
Corria pelas ruas
Mamãe a me chamar
Vem menino, sai da chuva
Vai se molhar!...
(etc, etc)

E se você, leitor, assim como nós, foi ou é fã da banda também conhecida pela sigla CCR veja como ficaria a segunda estrofe de PROUD MARY:

Pratos eu lavei em Memphis
Panelas areei lá em Nova Orleans
E nunca conheci o lado bom da vida
Até que um dia a sorte sorriu para mim
Na barca que descia o rio
A felicidade veio
Rollin'... rollin'... rollin' on the river  
  

sábado, 5 de novembro de 2011

VOCÊ É DEMAIS (Amar-se, amar-se, ah...)

VOCÊ É DEMAIS

          (letra e música: Achilles F. Abreu - Edenilton M. Peres)



A     E/G#     Fm#     Fm#7     B7     E

  A     E/G#   Fm
Todos os caminhos
    Fm#7   B7    E
Me levam a você
  A   E/G#    Fm
Você é meu ninho
      Fm#7   B7     E
Em cada entardecer
   A    E/G#   Fm
Todos os carinhos
    Fm#7   B7    E
Eu quero de você
      A         E/G#       Fm
Amar-se, amar-se, amar-se
    Fm#7    B7      E
Amar-se até morrer
 A       E/G#   Fm
Eu sou passarinho
  Fm#7 B7  E
E você é você...
            Cm#           Fm#
Quando tudo está errado
    Fm#7  B7      E
Você sorri pra mim
        A       B7         E
E reduz o mal, meu mal
                 Cm#
Mesmo que o céu
            Fm#
Esteja escuro
    Fm#7  B7   E
Eu sou feliz assim
               A        B7         E
Você é a luz do sol, meu sol
 E                        B7
Você faz meu mundo
                   E
De amor e paz
 E                    B7
Você colore a vida
                                E
Como ninguém mais faz
                   A
Você é demais
                  B7
Oh, oh, oh, oh
                   E
Você é demais.


Esta canção fora dedicada a Márcia R. Brzozowski, funcionária da Prefeitura Municipal de Cubatão, SP.
À época chegamos a ministrar naquele município um curso de teatro (preparação de atores, técnicos, etc) em nível de iniciação.   Cubatão sempre foi palco de grandiosas representações da Paixão de Cristo, encenada anualmente com populares nos papéis de Jesus, Maria, Maria Madalena, Judas, Simão, Herodes, Pilatos, Caifás, Pedro, Verônica, centuriões romanos, a patuleia, etc. Com amadores - na mais verdadeira acepção da palavra.   O convite nos fora feito visando preparar os interessados em montar outros tipos de espetáculos teatrais, diversificando assim as possibilidades do fazer teatral na cidade e ampliando o conhecimento dos interessados na área.   Fizemos muitos amigos, dentre os quais as irmãs Tertuliano.   Estas, logo em seguida foram aprovadas em concurso público e foram incorporadas a PM Feminina para gáudio de sua família (gente humilde, batalhadora e honestíssima) e de todos aqueles que tiveram o prazer e o privilégio de os conhecer.   Também impossível é deixar de mencionar o amigo, diretor-presidente do COTAC - Centro Organizador do Teatro Amador de Cubatão, Alex Farah.   Não vou resistir ao trocadilho: Farah fazia mesmo; sempre fez.   Com extrema competência.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

TRIBUTE TO JIMMI HENDRIX (WOODSTOCK)

TRIBUTE TO JIMMI HENDRIX   (WOODSTOCK)

                       (Achilles F. Abreu)


The open prarie
     Full of flowers ev'rywhere
And free love-making...
     Hell and heaven - well known there.
And in the center
     Of the prarie
          There's a stage
And all around it
     Crowd of people
           Of young age!

It was no Congress
     Or a Vietnam wrestling
But kind of protest
     Thru the guitarman's strings!

Sounded almost like a cry
For the whole wide world to hear
That the youth want to be free
Free of prejudice, free for love!

Today he's lost away
     Somewhere in the space...
          His body's lifeless, useless...
Nothing else he can do or say

And his friendly guitar's
     Quiet forever now...
          No more songs of love and joy
And understanding; but somehow

          His lesson the youth has heard
                    All over the world
                    All over the world
           His lesson the youth has heard

Good-bye Jimmi Hendrix
And thank you
(now take good care of yourself)

          Jimmi
               Jimmi
                    Jimmi
                         Jimmi Hendrix - Love!
                         Jimmi Hendrix - Flower! 


Acesse http://youtu.be/wyGGG1l-rf8


Uma das primeiras experiências realizadas por este autor em termos de redigir em língua inglesa algum poema.   O texto, pensado inicialmente em português, foi elaborado em parceria com Edenilton Mendes Peres e teve contribuições, em termos de correção, de uma tia residente em L.A., Ca. desde sempre.
Edenilton, ou Didí, era aficionado mesmo pelo grupo "Bread" e curtia canções mais românticas, mais dolentes...   Fizemos parceria em VOCÊ É DEMAIS, cuja versão nossa para o idioma inglês se perdeu no papel e na memória.   Essa canção - parece hoje - tinha já o sabor daquilo que viria a ser bem mais tarde a assim chamada "música sertaneja"...   Fato é que a versão em inglês que fizemos foi apresentada em 'bailinhos' da época, pelo conjunto (é como se dizia à época) santista Blow Up, de enorme sucesso para aqueles tempos... E quem ouviu achou que se tratava de hit internacional!   (Bem, eu, justamente o autor da letra - em português e em inglês -não estive presente e portanto não vou jurar.   Mas o Didí garante que assim se passou).

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

ECCE HOMO

ECCE  HOMO


Tu, Homem!
Tu, animal...
Que te consomes
Entre o Bem e o Mal;
És caminhante...
És a estrada...
- O pé e o pó!
O pé errante,
O pó que é nada,
Tu és tão só!
Então tu pisas,
E és pisado!
- O pé e o pó...
Tu, Homem!
Tu, animal...
Que te consomes
Entre o Bem e o Mal;
És em verdade ,
Uma mentira!
Quem és?   Que vês?
Talvez bem tarde
Mas chega o dia
Do teu revés...
Atrás das grades
Só tu te miras:
- Quem és?... Que vês?...
Tu és a praga,
E o fungicida...
A estiagem,
E a chuva boa...
És a fuligem,
E o ar do campo...
És a geada,
E raio de sol...
Tu és a fome,
E a sobremesa...
Negociante,
Mercadoria...
Na vitrine estás a venda
E teu preço é ocasião!
Tu és o crime
E a recompensa...
És a oferta
E a procura...
O luxo que mofa,
O lixo que resta;
Espírito em luto,
A carne em festa...
O próprio Templo;
A própria cova;
O próprio Tempo;
E a Vida nova!


 
Os versos acima foram pensados para serem declamados em off (por ator com vozeirão, e reproduzidos no sistema de som do teatro através de caixas acústicas potentes) na cena inicial da peça colagem "LIMITE DE CONSCIÊNCIA", de Napoleão Tavares, ensaiada à exaustão no Círculo Operário do Embaré e apresentada ao público no Teatro Municipal de Santos.   O palco, representando a consciência do Homem - personagem central da peça, tinha na boca de cena, nas laterais e ao fundo, atores agachados em posição que fazia lembrar "O Pensador" de Rodin e que se levantavam em "slow motion" a medida que música instrumental 'soturna' era reproduzida e as luzes se faziam em "fade-in"...   Esses atores personificavam demônios que iam se altivando e virando-se para a platéia e estendendo em mesura, num convite, os braços e as mãos para receber  o Homem, que adentrava o teatro em meio à plateia e dirigia-se para o palco para enfrentar cara a cara sua condição humana, muito humana... existencial




Parte do elenco (grande; tinha o autor Napoleão Tavares fazendo Lúcifer, seu séquito de demônios hierarquisados, um "corpo de baile" fazendo as Ninfas, os Profetas, etc, etc...)      Nestas fotos: Acima, e imediatamente abaixo, o ator principal.   Na terceira, um dos 'profetas'.
Também nessas fotos outros integrantes, dentre os quais este pobre diabo.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

ORDINÁRIO... MARCHA! / SUL FABRIL (ou A NUDEZ GÉLIDA DE UM MANEQUIM DE LOJA RECOBERTA DE AURIVERDE SENTIMENTO)

PICKLES, a peça teatral, foi alvo de críticas diversas, opiniões divergentes: desde a da aluna e colega que acusava o autor, diretor e produtor - no caso, nós - de colocar em cena atores "que não sabiam o que estavam a representar", até a daqueles que abertamente declaravam não ter entendido a mensagem (alguns ainda acrescentavam que apesar disso viam certo deslumbramento na estranheza do espetáculo pois, afinal, não eram afeitos a ir ver espetáculos teatrais - raros na cidade e mais raros ainda no ambiente escolar.)   Houve ainda um ou outro que, sabe-se lá, juravam "de pés juntos" que tudo era muito claro, óbvio até, e que haviam apreciado ou não a peça, seja pela música (incidental), pela poesia, pela atuação do elenco ( formado por amadores), pela profusão de signos...   Uma das professoras do Curso de Letras - Unifran (que ministrava Linguística - ou Teoria Literária? ou Semiologia? Isso, Semiologia, sem dúvida) cujo nome a memória não guardou, acorreu a defender o trabalho de arte apresentado.
De fato, mais importante do que o texto verbal em PICKLES é o texto não-verbal, icônico, imagético, justamente aquela profusão de signos... ainda que tenhamos sempre apreciado o texto (verbal) em peças de teatro.   Como não se apaixonar pelos textos de um Édipo Rei, de Sófocles; de um Othelo, de Shakespeare; de um Senhorita Júlia ou um A Mais Forte, de Strindberg; de um texto de Moliére; de Nelson Rodrigues; de Tennessee Williams; dos autores italianos, russos, e tantos mais...
Mas em PICKLES, a peça, o que mais contava era de fato o que era mostrado; mais do que o que era dito.   Assim é que uma das cenas mais emblemáticas da peça era a cena na qual um manequim de loja, feminino, tinha sua nudez gélida coberta com a bandeira nacional enquanto os atores recitavam e cantavam os textos a seguir:


"ORDINÁRIO... MARCHA!"                                                  "SEM TÍTULO" (ou Sul Fabril)
                     (letra e música: Achilles F. Abreu)                                         Achilles F. Abreu


        Toda essa gente                                                               Você me dá
          Faz que não vê...                                                            Pipoca,
            Vai sempre em frente,                                                   Eu lhe ofereço chocolate;
              Não quer nem saber!                                                  A gente aí se toca
                                                                                                - Vê como o coração bate!

        As coisas vão mal,                                                            Êta verso pueril!
          Mas devem mudar...
            - Espere sentado                                                          PARLAMENTARISMO
              P'ra não se cansar!
                                                                                                Pau
                      Ou...                                                                    -
                                                                                                brasil
        Saia p'ra rua
            E grite e destrua;                                                           Você me põe
        Acabe com seu conformismo.                                            Só risos,
                                                                                                 Você me deixa de careta;
            Salve!   Salve!                                                               A gente já não tem juízo
                                                                                                 A coisa anda mesmo preta
                   Salve o nacionalismo!
                                                                                                Êta canto varonil!

                                                                                                PRESIDENCIALISMO

                                                                                                Sul

                                                                                                Fabril



Com a cena descrita acima, sucintamente, buscava-se abordar dentro do contexto geral da peça PICKLES a necessidade urgente de fazer com que os filhos da Pátria, a Nação, fossem tomados de um sentimento de patriotismo, de nacionalismo, de brasilidade... que abandonassem o "analfabetismo político" (Berthold Brecht), engajando-se na discussão das questões políticas, econômicas e sociais, com responsabilidade.  Procurou-se evitar ao máximo o tom panfletário...
Já dissemos alhures, penso eu, que esse aderêço de cena - o manequim de loja - fora gentilmente emprestado pelo Sr. Antonio Eustáquio, à época gerente de uma das lojas do Magazine Luiza em Franca,SP.   Não poderíamos deixar de consignar nossos agradecimentos a essas pessoas (física e jurídica) pelo seu inestimável apoio à arte e à educação.         

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

TREES, de Joyce Kilmer

21 SET Dia da Árvore

Encontrei em meio a papéis avulsos, de longa data guardados, em cópia carbono datilografada, já um tanto apagada, o poema TREES, de Joyce Kilmer - que compartilho. (Apresento em seguida tradução livre deste blogueiro).


TREES    
                                                    ( Joyce Kilmer )

I think that I shall never see
A poem lovely as a tree.

A tree whose hungry mouth is pressed
Against the sweet earth's flowing breast;

A tree that looks at God all day
                                                           And lifts her leafy arms to pray;

                                                            A tree that may in summer wear
                                                            A nest of robins in her hair;

                                                           Upon whose bosom snow has lain;
                                                           Who intimately lives with rain.

                                                           Poems are made by fools like me
                                                           But only God can make a tree.


Fotos: Achilles F. Abreu

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

NOTA DO AUTOR (1985)

NOTA DO AUTOR


                                                                 14.
                                                                 Veras rimas (?) ou meras palavras.
                                                                 Dedico este opúsculo ao "REBULIÇO DE ARTE".
                                                                 Desejo agradecer de modo especial a MÔNICA BATISTA pela escolha do material, apresentação e sugestões várias.
                                                                 Pretendí, com a inclusão de "Phoenix" e do refrão de "Jôgo Perigoso", render homenagem aos companheiros dos antigos festivais FEMPO, FICO, FEMUCAN e outros.  
                                                                 A maior parte do trabalho aqui apresentado se complementa nas respectivas partituras musicais de cada 'letra', tendo participado de festivais, entre outras: "Rumo Sul", "Identidade", "O seu Jôgo e o seu Preço".
                                                                As datas, mencionadas à margem, como referencial histórico-psicoafetivo, nem sempre são precisas.
                                                                Passado o tempo, reflito sôbre a indigência que essa produção de juventude caracteriza, renegando em grande parte, hoje, temática, forma e posicionamento (engajado ou não) não reconhecendo aí valor poético, propriamente (ou mesmo literário).   Portanto um libreto sem qualquer pretensão - inteiramente descartável.   Dispensável em qualquer boa biblioteca.
                                                                Resgatar do pó do tempo, do escuro e sufocado fundo de uma gaveta estes escritos não tem qualquer pretensão outra que não o desejo simples de encontrar mãos, olhos, boca, de um outro ser tocado então, quem sabe, no seu íntimo, em essência, e neste instante, por este ato, verificar inda uma vêz o fato de que não somos nada estranhos...    Só temos entre nós uma distância que não se quer estreitar.   No encontro, no toque... a poesia!

                                                                                         A. Fabreu 

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

FANTASMAS DE UM TEMPO BOM

FANTASMAS DE UM TEMPO BOM

Confuso, difuso,
Eu uso e abuso...
Saturo o escuro,
O futuro procuro...
Co'a mente descrente
Das gentes, das frentes,
Me volto e me solto
Num vôo... num sonho!...
Meu passado, real,
É meu presente fantasia...
São fantasmas de um tempo
Que eu quisera voltasse um dia!...
Busco desesperado,
No presente, o passado,
Para ser futuro e me ver brincar...
(Com alegria!)
Tanta é a saudade
Que parece até verdade
Que esse tempo ainda pode e vai voltar...
(Na poesia!)
Pulo mais um muro...
Faço mais um furo...
Bato bem mais duro...
Quero um ar mais puro....
Isso eu não aturo;
Eu juro, eu juro, eu juro.


          Edenilton Mendes Peres, o Didi da bacia do Macuco (zona portuária da cidade de Santos, SP) se propusera a musicar os versos acima, lá pelos idos de ...  final dos 70, começo dos 80 talvez.  


Alagoinhas, BA   -   Anos 70   (Olhos d'Água)


segunda-feira, 15 de agosto de 2011

SEM ESSA DE GRILOS

SEM ESSA DE GRILOS                                                                             
                (letra e música: Achilles F. Abreu)

Você precisa ter
Um bom motivo p'ra gritar...
Mas não precisa ter
Razão nenhuma p'ra calar...
Cale dentro do seu peito amor
Que não possa florescer,
Porque é muito mais perfeito amor
Que exige renúncia porque
"Amor só é bom se doer!..."

Você precisa ter
Um bom motivo p'ra agredir...
Mas não precisa ter
Razão nenhuma p'ra sorrir...
Quero ver em seu rosto estampar
Alegria de viver!
Quero ver que você sabe amar,
Perdoar e o mal esquecer...
"Perdoar quer dizer esquecer!..."

Vá viver a vida!
Esquece a ferida
Que um dia doeu... pois, tal,
Não vai mais sangrar...
Vida
É senão estrada
- uma pedra só é nada -
Taí, que o essencial
É pois viajar!...

Você precisa ter
Um bom motivo p'ra chorar...
Mas não precisa ter
Razão nenhuma p'ra cantar...
Cante sempre um refrão qualquer,
Da maneira que entender...
Faz da vida um festival, pois é
Que a morte é um não sei o quê!...
A Morte é um não sei o quê!...

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

ETIQUETA

ETIQUETA
          (letra e música: Achilles F. Abreu)


Eu na rede...
Ela na teia...
Eu tão vazio e verde,
Ela madura e cheia.

     Eu com sede...
     Ela com fome...
     Eu me aprisiono na rede,
     Ela na teia se consome.
         
          Esquece o nome,
          Me diz nome feio,
          Primeiro me faz Super-Homem,
          Agora me planta no meio...

               Não ouço o apelo
               Que faz a razão,
               Apenas arranco-lhe o selo
               - Etiqueta de alto padrão.


          Após interregno com "PÃO" e "WAVE", retomo o livrinho PICKLES, edição do autor, de 1985: à página 12 encontrava-se este ETIQUETA, eivado de machismo explícito, rasteiro.   Os versos foram compostos em resposta a certa colocação ouvida "casualmente", e que se fez constar logo abaixo do título, naquela publicação ( quando "ser virgem é apenas uma questão de falta de oportunidade" - sic ).    
          Algum tempo depois, estava a passeio por Embu das Artes acompanhado de uma mulher jovem, bonita,  fogosa, inteligente e formada em psicologia - psicanalista, com clínica própria bem montada, bem estabelecida, em São Paulo (no Alto da Lapa) - quando esta me pede para declamar alguma coisa ali, já que estavam ocorrendo, naquele momento, apresentações espontâneas de populares, de quem quisesse fazer uso da palavra, digamos, artisticamente (entenda-se: provocativamente), e recitei então os abomináveis versos de ETIQUETA.   Que "mico" !  

sábado, 30 de julho de 2011

WAVE!

A ONDA
                             Manuel Bandeira


a onda anda
aonde anda
a onda?
a onda ainda
ainda onda
ainda anda
aonde?
aonde?
a onda   a onda



~~  W A V E  !!!  ~~ 

          Recentemente, os amigos, fomos brindados com a postagem no Facebook de fotos de colega professora, nossa companheira de jornada na árdua, porém gratificante, missão de ensinar a crianças,  jovens e adultos.   Eram fotos de álbum de família.   
          Em meio às fotos lindíssimas, estava estampada a poesia concreta de Manuel Bandeira, A Onda ("Aonde anda a onda").
          Busquei, sem êxito, identificar nexo causal entre as fotos do belíssimo álbum de família (onde o sorriso largo nos rostos e a indizível alegria nos olhares eram mais que adorno perfeito do exemplo de família feliz) e o referido texto poético, transcrito acima.  
          Foi assim que resolvi arriscar e juntar a ideia de onda à imagem de um sorriso e compor uns versinhos, apressadamente, permitindo um fluxo de (in)consciência, de livre associação de signos.   Sem maiores pretenções...   Sem segundas intenções...   Sem onda...

A onda gigante tsunami
A onda radioativa Fukushima
A onda verde dos ianomami
Chico Mendes
Zé Claudio
Stang
tantos
A onda assassina.
A onda... essa sina...
A onda só marola, marolinha
Bem lulinha, paz e amor
A onda Jack Johnson, surf e internet
A onda virtual
Wall Street
('hot money')
Ondas do rádio, tv, mobile phones
"A onda que quebrou no mar"
Me trouxe até você
Me jogou na areia
Me quebrou a cara
Alva onda refrescante do seu sorriso lindo.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

PÃO

PÃO

          Tenho em mãos uma embalagem confeccionada em papel pardo destinada a acondicionar pão de sal - ou pão francês, como se diz - e que me chama a atenção de modo especial.
          Esses "pacotes", ou "cartuchos", ou "sacos", em papel pardo ("papel de pão"), como tantas vezes são referidos dependendo do regionalismo, têm sido substituídos ultimamente por embalagens plásticas que não têm, a meu ver, o mesmo charme da embalagem tradicional; além de constituirem-se em agravante das questões ambientais (sabemos: o papel é biodegradável, ao contrário do plástico).
          Mas o que há nesta embalagem específica que tenho ora em mãos que me chame tanto a atenção e, mais do que isso, me dá uma grande satisfação?
          Alí, pode-se aprender que para cada 50 gramas de pão tem-se, como valor nutricional, 134,50 kcal; 4,65 g de proteínas; 28,70 g de glicídios; além de dosagens de lipídios, colesterol, e minerais como cálcio, ferro e fósforo.   Interessante.   Mas isso, certamente, é obrigatoriedade definida em legislação pertinente.
          Ali, temos também impressas, sob os respectivos logos (signos), as legendas "embalagem reciclável" e "mantenha a cidade limpa".   Importante.
          Também ali, centralizado, em caixa alta e em cores vivas, lê-se o nome fantasia do estabelecimento - uma padaria situada no bairro Jardim Paulista, em Ribeirão Preto, SP - acrescido da Razão Social e respectivo número de inscrição no CNPJ, do endereço e dos dizeres de "grato pela preferência" e do slogan.   (Pode não parecer, mas não há poluição visual ali presente.   Todo o espaço foi bem aproveitado.)
          No entanto, o que esta embalagem tem a mais, em relação a tantas outras, é o fato de trazer impresso um poema de Fernando Pessoa que faço questão de reproduzir aqui:

" Posso ter defeitos, viver ansioso e ficar irritado algumas vezes, mas não esqueço de que minha vida é a maior empresa do mundo.   E que posso evitar que ela vá à falência.   Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver, apesar de todos os desafios, incompreensões e períodos de crise.   Ser feliz é deixar de ser vítima dos problemas e se tornar um autor da própria história.   É atravessar desertos fora de si, mas ser capaz de encontrar um oásis no recôndito da sua alma.   É agradecer a Deus a cada manhã pelo milagre da vida.   Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos.   É saber falar de si mesmo.   É ter coragem para ouvir um "não".   É ter segurança para receber uma crítica, mesmo que injusta.  Pedras no caminho?   Guardo todas, um dia vou construir um castelo... " 

          De imediato me vêm à mente os versos de Moraes Moreira na música "Pão e Poesia", que acostumei a ouvir na interpretação de Simone.
          Acorrem, também de pronto, os versos de "Comida", música dos Titãs interpretada soberbamente por Marisa Monte.
          Assim, se dentro da singela embalagem se coloca o pão do corpo, por fora dela se estampa como pão da alma um poema.
          Tal exemplo maravilhoso deveria se disseminar - promovendo, recuperando uma maior sensibilidade já perdida no caos cotidiano... - substituindo, por fim, o embrutecedor "panis et circensis" romano remanecente na avalanche de mensagens que sobre nós desaba de forma mais direta, mais invasiva, mais imediata e estúpida.
          Poesia urgente.  
          Poesia,  já!